Apagões em Portugal, Espanha e Brasil: o preço da transição energética sem inércia

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Os apagões recentes em Portugal, Espanha e Brasil expõem a falta de inércia nos sistemas elétricos com alta penetração de renováveis. Descubra as causas e soluções.

A transição energética é uma realidade global. Países como Portugal, Espanha e Brasil têm investido pesadamente em fontes renováveis como solar e eólica. Esses movimentos são essenciais para a sustentabilidade ambiental e a independência energética, mas também trazem novos desafios à estabilidade da rede elétrica.

Dois eventos recentes colocaram essa fragilidade em evidência: o apagão da Península Ibérica, em 28 de abril de 2025, e o grande apagão brasileiro, em 15 de agosto de 2023. Ambos expuseram um problema técnico comum — a falta de inércia no sistema elétrico — causada justamente pela crescente presença de usinas renováveis intermitentes.

Neste artigo, vamos analisar o que esses dois apagões têm em comum, por que a falta de inércia é tão crítica e como soluções como inércia sintética e bancos de baterias podem ajudar a evitar colapsos semelhantes no futuro.

O que é inércia elétrica?

Antes de entrar nos casos específicos, é importante entender o conceito de inércia elétrica. Em redes com usinas tradicionais (como hidroelétricas e térmicas), os grandes geradores giram em sincronia com a frequência da rede (normalmente 50 Hz ou 60 Hz). Esse movimento físico cria uma reserva de energia cinética, que ajuda a manter a estabilidade da rede diante de variações rápidas de carga ou geração.

Quando ocorre uma perturbação, essa inércia age como um “amortecedor”, suavizando os impactos. Sem ela, qualquer falha pode levar a oscilações bruscas de frequência e desligamentos automáticos em cascata — exatamente o que ocorreu nos apagões recentes.

Caso 1: Península Ibérica (Portugal e Espanha)

No dia 28 de abril de 2025, um apagão afetou Portugal, Espanha, Andorra e parte da França. O blecaute teve início com a perda súbita de 2,2 GW de energia elétrica na Espanha, atribuída à desconexão de subestações em Granada e Badajoz. Como grande parte da energia da Península é atualmente gerada por fontes renováveis com baixa inércia, como solar e eólica, a rede não teve capacidade de absorver o impacto.

Portugal, mesmo com mais de 76% de sua energia oriunda de fontes renováveis, sofreu pela falta de respostas rápidas do sistema, com oscilações de frequência que derrubaram toda a rede em minutos. O restabelecimento só foi possível graças a centrais com capacidade de arranque autónomo, como Tapada do Outeiro.

Caso 2: Brasil

Em 15 de agosto de 2023, o Brasil enfrentou seu maior apagão desde 2009. Uma falha entre as regiões Norte e Sudeste provocou a perda de 16 mil MW — aproximadamente 25% da demanda nacional no momento. A queda foi tão brusca que não houve tempo para resposta de contingência, levando ao desligamento automático de praticamente toda a malha interligada nacional.

Assim como na Europa, o sistema elétrico brasileiro tem investido fortemente em energia solar e eólica. Em 2023, a energia renovável já representava mais de 60% da matriz elétrica do país. Contudo, a maior parte dessas usinas não contribui com inércia, por serem baseadas em inversores eletrônicos e não em geradores rotativos.

O elo comum: alta penetração de renováveis e baixa inércia

Esses dois eventos mostram um padrão: quanto maior a participação de energias renováveis intermitentes, menor a capacidade de a rede responder a perturbações. A ausência de inércia natural leva a instabilidades rápidas e, em alguns casos, incontroláveis.

A substituição das usinas convencionais por painéis solares e turbinas eólicas tem, portanto, um custo técnico: a perda da capacidade de estabilização passiva da frequência.

Caminhos para a solução: inércia sintética e bancos de baterias

Felizmente, há soluções tecnológicas que já estão sendo implementadas ou testadas em várias partes do mundo. Duas das principais são:

1. Inércia Sintética

A inércia sintética simula o comportamento dos geradores tradicionais por meio de algoritmos em inversores inteligentes. Esses dispositivos conseguem detectar quedas de frequência e injetar energia instantaneamente para mitigar oscilações. Turbinas eólicas modernas e alguns inversores solares já vêm com essa capacidade.

Além disso, tecnologias como síncronos condensadores também podem ser instaladas em subestações estratégicas para fornecer inércia adicional.

2. Bancos de Baterias

Outra solução promissora são os sistemas de armazenamento de energia com resposta rápida. Bancos de baterias, especialmente os baseados em lítio, conseguem reagir em milissegundos a variações de carga ou frequência. Quando integrados a comunidades energéticas ou a pontos críticos da rede, esses sistemas funcionam como uma “margem de segurança” elétrica.

Portugal, por exemplo, já prevê a integração de baterias em projetos de comunidades de energia. O Brasil também estuda a criação de uma regulamentação específica para permitir o uso comercial de baterias na rede nacional.

Conclusão: o futuro depende da resiliência

A transição energética é irreversível e necessária, mas não pode ignorar os requisitos técnicos da operação segura do sistema elétrico. A falta de inércia natural nos sistemas com altas taxas de renováveis exige novas abordagens, mais inteligentes e automatizadas.

Apagões como os de 2023 no Brasil e 2025 na Península Ibérica são sinais de alerta. Eles mostram que a sustentabilidade deve vir acompanhada de investimentos em resiliência, automação e armazenamento.

É hora de planejar não só como gerar energia limpa, mas também como garantir que ela continue fluindo com estabilidade, mesmo diante das adversidades.

Fontes externas:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Apag%C3%A3o_na_Pen%C3%ADnsula_Ib%C3%A9rica_em_2025
https://pt.wikipedia.org/wiki/Apag%C3%A3o_no_Brasil_em_2023
https://oglobo.globo.com/economia/noticia/2023/08/16/apos-maior-apagao-desde-2009-governo-pede-investigacao-sobre-as-causas.ghtml
https://www.erse.pt/media/j22obg3d/ersexplica-apag%C3%A3o-abil-2025_vfinal.pdf

Se quiser saber mais sobre regras de rede visite o post

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